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Vida e Saúde

Câncer é a doença que mais mata crianças e adolescentes no Brasil

Somados, os casos de câncer que acometem a faixa de 1 a 19 anos resultam em mais de 2,5 mil mortes anuais no país, segundo o INCA. O diagnóstico em fase inicial aumenta as chances de sucesso no tratamento

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Isoladamente, cada tipo de câncer infantojuvenil é raro. Somando-se todos casos que ocorrem até os 19 anos de idade no mundo são 319.840 novos diagnósticos por ano, representando cerca de 2% da incidência mundial em todas as faixas etárias1. O câncer é a maior causa de morte não violenta de crianças e adolescentes no mundo2. Os tipos mais comuns são as leucemias (que afetam os glóbulos brancos), os linfomas (que afetam o sistema linfático), os tumores do sistema nervo central e tumores sólidos, principalmente o tumor de Wilms (tipo de câncer renal que é comum na infância).

No país, são 2.565 mortes anuais, segundo o Atlas de Mortalidade por Câncer do Instituto Nacional de Câncer (INCA). Ainda de acordo com o INCA, estima-se que 8.460 brasileiros de 1 a 19 anos recebam anualmente o diagnóstico de câncer, sendo 4310 meninos e 4150 meninas3. A Sociedade Brasileira de Patologia (SBP), com a proposta de conscientizar a população sobre o câncer infantojuvenil, está publicando durante o Setembro Dourado uma série especial em seus perfis nas mídias sociais que mostra o quanto o diagnóstico correto de cada subtipo de câncer nesta faixa etária reflete no sucesso do tratamento, em maiores taxas de cura e menor ocorrência de efeitos colaterais tardios no paciente sobrevivente.

O câncer infantojuvenil, na maioria dos casos, tem um comportamento biológico diferente da doença em adultos. Os tumores na infância são de origem embrionária, enquanto o câncer em adultos tem forte influência da interação com os carcinógenos no ambiente, que promovem mutações somáticas (alterações que se acumulam ao longo da vida). “Na criança, o câncer, geralmente, tem como fator de desenvolvimento o resultado de alterações no DNA (gene) das células, que ocorrem muito precocemente, às vezes até antes do nascimento, e provocam a multiplicação celular de forma desordenada”, destaca a médica patologista Isabela Werneck da Cunha, vice-presidente para assuntos acadêmicos da SBP e coordenadora médica da equipe de Patologia da Rede D’OR São Luiz em São Paulo.

DIAGNÓSTICO – Segundo o INCA, 8 entre 10 crianças e adolescentes diagnosticados com câncer podem ser curados se diagnosticados precocemente e tratados em centros especializados. “O papel do médico patologista é essencial nesse processo, sendo ele o responsável por identificar cada tipo de tumor e fazer o estadiamento, que é a definição do grau de agressividade e das características da doença”, comenta Isabela Werneck.

Entre os exames que o médico patologista pode analisar e laudar estão: biópsias – fragmentos de tecido ou órgão são retirados; punções aspirativas – células do sítio do tumor e líquidos de cavidades; peças cirúrgicas – amplas ressecções de lesões ou órgãos; imunohistoquímica – utilização de anticorpos contra antígenos específicos; patologia molecular – pesquisa de biomarcadores indicativos das doenças; entre outros.

TRATAMENTO – De acordo com a médica oncopediatra da Rede D’OR São Luiz, Dra. Viviane Sonaglio, o tratamento do câncer infantojuvenil consiste em quimioterapia, radioterapia e cirurgia, podem ser adotados isoladamente ou em combinação. “A definição da melhor abordagem terapêutica é feita por um time multidisciplinar, que contempla o médico patologista, radiologista, dentre outros especialistas em tumores pediátricos”, contextualiza Viviane.

No geral, os pacientes respondem bem à quimioterapia. A radioterapia é indicada para tratar tumores sólidos, mas também pode ser utilizada em casos de leucemias e linfomas. A cirurgia é indicada principalmente para casos selecionados de neuroblastoma, tumor de Wilms, osteosarcomas, assim como tumores hepáticos (fígado) e sarcomas.

“O cirurgião faz parte do cuidado da criança com câncer desde o momento da biópsia para o diagnóstico até nas cirurgias mais extensas das quais depende a cura do paciente. Elas podem ser realizadas por modalidade aberta, laparoscópica ou laparoscópica com assistência robótica. A escolha por cada técnica dependerá da extensão, localização, envolvimento de estruturas nobres, além de outros aspectos biológicos da doença e clínicos do paciente”, detalha a cirurgiã e head da Cirurgia Pediátrica do A.C.Camargo Cancer Center, Maria Lúcia de Pinho Apezzato.

Com a alta taxa de cura, muitos pacientes com câncer na infância são sobreviventes a longo prazo. “É fundamental que eles sejam acompanhados por uma equipe especializada e multidisciplinar, para que sejam identificados quaisquer sinais e sintomas relacionados ao tratamento recebido na infância ou adolescência, de tal forma que possamos manter este paciente produtivo e com ótima qualidade de vida mesmo que 20, 30, 40 ou mais anos após o tratamento ao qual ele foi submetido”, destaca Viviane Sonaglio.

OS TIPOS MAIS COMUNS DE CÂNCER INFANTOJUVENIL 4, 5, 6

  • Leucemias – É o câncer pediátrico mais comum no país. Os subtipos são divididos em Leucemia Linfóide Aguda (mais comum dos 2 aos 5 anos, podendo acometer também em idade adulta) e as Leucemias Mielóide Crônica e Mielóide Aguda (que acometem pacientes das mais variadas idades). Outro tipo, a Leucemia Linfóide Crônica, não é uma doença pediátrica, sendo mais comum a partir dos 55 anos. Os sintomas mais evidentes da leucemia são fraqueza, cansaço, febre e outros quadros infecciosos, hematomas e sangramentos na gengiva e nariz. O exame que indica a suspeita de leucemia é o hemograma, pelo qual se avalia as condições dos vários tipos de células do sangue. A partir da suspeita de leucemia é recomendada a realização de exames da medula óssea – mielograma e biópsia de medula óssea – que permitem identificar a presença de células anormais, que prejudicam a fabricação dos outros elementos do sangue. Outros exames também podem ser necessários para confirmação do diagnóstico e melhor caracterização da doença, como imunofenotipagem, citogenética e exames de análise molecular, feitos pelo patologista.
  • Linfomas – A doença se desenvolve em uma das células do sistema imune de defesa, chamada linfócito. Esta célula, que normalmente pode circular pelo sangue, pela linfa ou mesmo permanecer nos gânglios, tem a função de organizar uma resposta mais específica contra um agente agressor, sobretudo no caso de vírus, assim como é capaz de reconhecer e eliminar células com defeito no nosso organismo. O linfoma ocorre a partir da proliferação descontrolada dos linfócitos, sendo comumente dividido em dois tipos principais: linfoma de Hodgkin (95% dos casos) e linfoma não Hodgkin. A doença de Hodgkin pode ocorrer em qualquer faixa etária, mas é mais comum entre adolescentes e adultos jovens (15 a 40 anos) e idosos (75 anos ou mais). Se houver suspeita da doença, o médico deve solicitar uma biópsia e o fragmento coletado será analisado pelo médico patologista que irá identificar se existe a presença do linfoma, qual é o tipo, subtipo e grau de estadiamento. Pode ainda ser necessário complementar-se o diagnóstico com testes específicos como a imunohistoquímica para avaliar o perfil molecular da célula afetada. Com todas essas informações fornecidas pelo laudo anatomopatológico será possível para o médico determinar a melhor conduta de tratamento. Já os Linfomas não Hodgkin são classificados de acordo com o tipo de linfócito afetado (células B ou células T) e também conforme o grau de agressividade (indolentes ou agressivos). Existem quase 50 tipos dessa doença com características diferentes, por isso, o médico patologista, para classificar o linfoma e determinar suas características, pode precisar analisar alguns testes complementares (como imunofenotipagem, genética molecular, marcadores celulares específicos). O diagnóstico preciso contribui efetivamente para a definição do o melhor tratamento para o paciente.
  • Neuroblastoma – Tipo de câncer que se desenvolve em formas primitivas das células nervosas (neuroblastos) do sistema nervoso simpático. O neuroblastoma pode acometer a glândula adrenal, coluna espinhal, tórax, pescoço e pelve. É o quarto tipo de câncer mais comum na infância, com idade média de manifestação de 23 meses e pico até os quatro anos. É um pouco mais comum em meninos. Alguns casos progridem mais lentamente e outros são mais agressivos. Cerca de 2% dos casos dos neuroblastomas têm como fator de risco a herança genética, ou seja, as crianças herdam um risco aumentado para desenvolver a doença de um dos pais. Mudanças nos genes que acontecem durante o desenvolvimento fetal (anomalias congênitas) podem contribuir para um defeito de nascença e aumentar o risco para neuroblastoma.

Para diagnosticar o neuroblastoma, o médico solicita alguns exames, clínicos (sangue e urina) e de imagem, raios-x, ultrassonografia, ressonância magnética ou tomografia e cintilografia óssea. Geralmente é necessária a realização de uma biópsia para confirmar o diagnóstico e as características do tumor. O médico patologista é o responsável por fazer a análise do fragmento coletado e fornecer o laudo anatomopatológico com as características específicas do câncer (dimensões, tipo, subtipo, estadiamento, se existe metástase), o que vai ajudar a determinar a forma de tratamento. O neuroblastoma frequentemente se espalha para a medula óssea, por isso, a biópsia pode ser feita pela medula óssea, sem a necessidade de biópsia do tumor principal.

  • Hepatoblastoma – As crianças e adolescentes também podem ser acometidos por câncer no fígado. É o caso do hepatoblastoma, um tipo raro de câncer que acomete esse órgão. O fígado tem como principais funções filtrar e armazenar sangue, processar os alimentos ingeridos e produzir proteínas vitais para o corpo. A maioria dos hepatoblastomas ocorre no lobo direito e a partir dos primeiros 18 meses de vida até os 5 anos de idade. Alguns fatores aumentam o risco de desenvolvimento da doença: herança genética, crianças que tiveram precocemente infecção por hepatite B, que nasceram prematuramente e com baixo peso Para diagnosticar o hepatoblastoma, o médico vai solicitar alguns exames clínicos (sangue) e de imagem (ultrassonografia, tomografia computadorizada, ressonância magnética). Com esses resultados, para confirmar o diagnóstico, ainda será necessária a análise da biópsia pelo médico patologista, para determinar pelo laudo anatomopatológico as características do tumor tipo, subtipo e grau de agressividade, para delinear as melhores opções de início ou continuidade do tratamento.
  • Osteossarcoma – É mais comum a partir dos 10 anos de idade, principalmente na adolescência, na fase conhecida como “estirão do crescimento”. Geralmente, se desenvolve com mais frequência em áreas onde o osso está crescendo rapidamente: ossos ao redor do joelho, no fêmur distal (a parte inferior do osso da coxa) ou na tíbia proximal, e nos ossos do braço próximo ao ombro. Pode surgir também nos ossos da pelve (quadris), ombro e mandíbula. São muitos os subtipos do osteossarcoma, que são classificados de acordo com o grau: alto grau, grau intermediário ou baixo grau. Essa informação indica a agressividade do tumor.
  • Sarcomas de Ewing – São tumores ósseos menos comuns que o osteossarcoma e ocorrem com mais frequência no início da adolescência. Esse tipo de câncer tem origem nos ossos pélvicos (quadril), na parede torácica (costelas ou escápulas) ou no meio dos ossos da perna e podem ser classificados como: Sarcoma de Ewing ósseo, o mais comum deles, Sarcoma de Ewing extraósseo e Sarcoma Neuroectodérmico Periférico Primitivo. De acordo com evidências científicas, algumas alterações genéticas podem levar ao desenvolvimento do Sarcoma de Ewing. A maioria das células tumorais apresentam alterações no gene EWSR1, que é encontrado no cromossomo 22. Em alguns casos, pode haver também mutações no gene FUS, do cromossomo 16. Essas mutações não são herdadas. Elas se desenvolvem em uma célula após o nascimento, sem causa conhecida.
  • Rabdomiossarcoma – É um tumor que faz parte do grupo de sarcomas das partes moles. Se desenvolve nos músculos ligados aos ossos e atinge, principalmente, as regiões da cabeça e pescoço, sistema urinário e extremidades. Em 15% a 25% dos casos a doença é diagnosticada já com metástase (disseminada localmente ou à distância). Para saber se as células são cancerosas, e de que tipo, é necessária uma biópsia, que é analisada ao microscópio pelo médico patologista. Há vários tipos de biópsia e a escolha do procedimento vai depender da localização da massa tumoral e da idade da criança. No caso do rabdomiossarcoma, a biópsia pode ser cirúrgica, por agulha grossa ou core biopsy ou ainda biópsia por aspiração por agulha fina (BAAF).
  • Tumor de Wilms – Também conhecido como nefroblastoma, o tumor de Wilms é um câncer que tem origem no rim. É um tumor renal mais comum na infância. Pode acometer um ou os dois rins. A Sociedade Internacional de Oncologia Pediátrica (SIOP) desenvolve um estudo sobre tumor de Wilms, com apoio da Sociedade Brasileira de Patologia (SBP) e da Sociedade Brasileira de Oncologia Pediátrica (Sobope) e o Brasil, atualmente, apresenta o maior número de casos registrados nessa pesquisa em andamento. Para diagnosticar o tumor de Wilms, são realizados exames de imagem, como ultrassonografia de abdômen, radiografia de tórax, tomografia computadorizada de tórax, abdômen e pelve, ressonância nuclear magnética de abdômen e em alguns poucos casos biópsia da massa que é analisada pelo médico patologista.
  • Câncer do Sistema Nervoso Central (SNC) – Esse tipo de câncer acontece quando há o crescimento de células anormais no cérebro das crianças. De acordo com o Instituto Nacional do Câncer (Inca), corresponde ao tumor sólido mais comum na infância. Assim, é preciso estar atento a sinais e sintomas, como dor de cabeça persistente, vômito, visão alterada, sonolência, dificuldade para andar, crises convulsivas, perdas de marcos de desenvolvimento, entre outros. Em linhas gerais, o médico poderá solicitar exames de imagem, como a tomografia computadorizada de crânio com contraste e/ou ressonância magnética de crânio. Na presença de um tumor cerebral, a biópsia é a única maneira de fazer o diagnóstico definitivo. É este exame que aponta se o tumor é maligno ou benigno, por exemplo.
  • Retinoblastoma – Uma doença rara, mas que é o tipo de câncer de olho mais comum em crianças. O retinoblastoma se desenvolve na retina, localizada na parte posterior de olho. A doença é mais comum em bebês e crianças pequenas. Raramente é diagnosticado em crianças com idade acima de 6 anos. Se diagnosticada precocemente, as chances de cura são de 90%. No entanto, se a doença já estiver disseminada no olho esse percentual cai de forma acentuada. De caráter hereditário ou não, ocorre por meio de mutação em um gene no cromossomo 13. Pode afetar os dois olhos ou apenas um deles. O sinal mais evidente do retinoblastoma é a leucocoria que consiste em um reflexo branco semelhante ao do olho do gato, quando um feixe de luz artificial (o do flash no momento de uma foto, por exemplo) incide através da pupila. Em olhos saudáveis, esse reflexo é vermelho. Além disso, a criança também pode apresentar baixa visão, estrabismo e deformação do globo ocular. O diagnóstico pode ser feito logo que a criança nasce, na maternidade, ou em exames de rotina no oftalmologista nos primeiros anos de vida com o Teste do Reflexo Vermelho. Depois, exames de fundo do olho e de imagem, como ultrassonografia, tomografia computadorizada e ressonância magnética nuclear completam o diagnóstico.

SINAIS E SINTOMAS – Geralmente, na fase inicial, os sintomas são semelhantes aos de doenças comuns da infância e pode ser difícil identificar-se que se trata de um tumor maligno. Por isso, os pais devem estar atentos a qualquer alteração no organismo de seus filhos ou queixa que eles venham a fazer e que não tenha melhora.

Conheça 10 sintomas que podem ser indicativos de câncer infantojuvenil:

  1. Mudança repentina nos olhos ou na visão: mancha branca nos olhos, perda de visão, estrabismo, protrusão do globo ocular.
  2. Caroços pelo corpo ou inchaços e aumento de volume (abdômen, pélvis, cabeça e pescoço, testículos e glândulas) sem apresentar dor.
  3. Febre inexplicável que não tem melhora e sudorese noturna.
  4. Perda de peso repentina e sem explicação.
  5. Palidez e cansaço.
  6. Manchas roxas pelo corpo e sangramentos.
  7. Dores nos ossos, nas articulações e costas.
  8. Alteração no caminhar, na fala, tontura, perda de equilíbrio ou de coordenação.
  9. Dor de cabeça frequente, muitas vezes acompanhada de vômito.
  10. Tosse persistente ou falta de ar.

Sintomas que persistirem por mais de dez dias precisam de avaliação de um médico que provavelmente vai solicitar exames para chegar ao diagnóstico. Se houver suspeita de câncer, o caso deverá ser conduzido por um médico especialista em Oncologia. Na maioria dos casos, a confirmação do diagnóstico é feita pelo médico patologista, que é responsável pela análise macroscópica e microscópica do fragmento de tecido do órgão acometido.

Referências bibliográficas

1 – Bray F, Ferlay J, Soerjomataram I, Siegel RL, Torre LA, Jemal A. Global cancer statistics 2018: GLOBOCAN estimates of incidence and mortality worldwide for 36 cancers in 185 countries [published correction appears in CA Cancer J Clin. 2020 Jul;70(4):313]. CA Cancer J Clin. 2018;68(6):394-424.

2 – Organização Mundial da Saúde (OMS). https://www.who.int/news-room/fact-sheets/detail/cancer-in-children. Disponível em 08.SET.2020.
3 – Instituto Nacional de Câncer (INCA). https://www.inca.gov.br/tipos-de-cancer/cancer-infantojuvenil. Disponível em 08.SET.2020.
4 – Oncoguia. <http://www.oncoguia.org.br/conteudo/tipos-de-cancer/83/1/>. Disponível em 08.SET.2020.
5 – Instituto Nacional de Câncer (INCA). <https://www.inca.gov.br/tipos-de-cancer>. Disponível em 08.SET.2020.
6 – A.C.Camargo Cancer Center. <https://www.accamargo.org.br/sobre-o-cancer/tipos-de-cancer>. Disponível em 08.SET.2020.